quinta-feira, abril 03, 2008

Retorno do (ao) Cárcere


Do meu silêncio é que escuto minha voz e o roncar dos meus motores.

Sigo só, mas vejo companhia na minha sombra.

Delicada e muda, mas sempre presente.

Antes mau acompanhado que sozinho, como disse meu orixá.

No escuro é que preciso de luz, então chego em casa acendendo interruptores,

acelerando automóveis.

Abrindo janelas e portas com os dentes.

Com os olhos molhados de sal, acho os cacos das minhas antigas certezas.

Estive trancado por tanto tempo que não sei se estou por fora...

Já vi a morte, num sorriso franco.

Mas do nascimento, só me lembro do primeiro choro, como dizem os ciganos.

Perscrutar respostas nos cemitérios da carne.

Nas gargantas das perguntas.

Mas minhas perguntas não me interessam mais do que os ossos porosos que me erguem da terra.

Meu motocontínuo.

Meu relicário de sentenças.

Ando triste e sozinho, com a amnésia do meu computador.

A insônia e o bruxismo dos seus dentes me embalam noite adentro.

Minha gastrite, como amiga mais íntima. Mau educada e falastrona, mas sempre presente.

E a H. pylori me roendo por dentro,

meus antibióticos,

meus pãezinhos com manteiga.

As minhas músicas italianas, aquelas que ninguém ouve mais.

Minha idolatria por assuntos extintos.

Minha falta de assunto.

Sou um homem das cavernas aprendendo o amor no tapa.

Me afasto de toda gente pra entender esta gente, pra estar presente.

Midas de merda, fuligem de mim.

Rust never sleeps, como disse Neil Young.

Nem sempre abro os olhos, quando abro meu coração.

Nem sempre me calo, quando deveria...

Meus ouvidos, em saúde perfeita, me enganam.

Ou será só meu ego me tornando um sarcófago?!

Sou uma múmia milenar, sorrindo da própria sorte.